Como esse vírus vai permanecer entre nós por muitos anos, quase todas as crianças que não receberem a vacina, um dia serão infectadas. A maioria terá sintomas leves ou ficará assintomática, mas uma minoria apresentará a forma grave da doença. E se for sua filha ou filho?
Não é essa a mesma razão que nos faz vaciná-los contra sarampo, difteria, coqueluche e outras doenças de curso benigno na maioria das crianças, mas que podem causar complicações graves?
O caso da covid é comparável: crianças infectadas costumam evoluir com poucos ou nenhum sintoma, mas uma minoria desenvolve quadro de insuficiência respiratória que coloca a vida em risco.
A revista “Science” traz os últimos dados tabulados pelos Centers for Diseases Control (CDC), dos Estados Unidos, os mais completos já publicados. No início de 2020, as crianças representavam apenas 3% dos casos de covid, no país. Hoje, eles ultrapassam 25%, um contingente de mais de 6 milhões. Cerca de 2 milhões pertenciam à faixa dos 5 aos 11 anos.
No fim de outubro deste ano (2021), eram infectadas aproximadamente 100 mil crianças americanas por semana. Entre as dezenas de milhares hospitalizadas, 1/3 não apresentava problemas de saúde. Apesar de saudáveis, muitas necessitaram de internação em UTI.
Esses dados mostram que o Brasil precisa vacinar todas as crianças com mais de 2 anos (futuros estudos talvez demonstrem que pode ser antes). As perdas cognitivas por mantê-las em casa por quase dois anos são incalculáveis, especialmente no caso das mais pobres.
Nos Estados Unidos, já morreram 700 crianças. Covid está hoje entre as 10 principais causas de óbito na infância. Não há um caso sequer de morte causada pela vacina.
Apesar da contundência desses dados, as pesquisas revelam que 42% a 60% dos pais americanos admitem ser relutantes ou estar decididos a não vacinar seus filhos.
Um dos argumentos é o de que a vacinação não foi testada em número suficiente de crianças. O estudo que levou à aprovação das preparações da Pfizer e da Moderna (ambas com a tecnologia do RNA mensageiro) para adultos, envolveu 40 mil participantes, enquanto aquele realizado na faixa etária de 5 a 11 anos reuniu 2.400.
Embora com números menores, entretanto, a pesquisa com as crianças foi estatisticamente muito significante: eficácia de 90,7% na prevenção de sintomas da doença, isto é, apenas uma em cada dez imunizadas apresentou algum sintoma. Não houve mortes.
Outro argumento contra a vacinação seria o risco de miocardite, processo inflamatório que atinge as células musculares do coração. Nos estudos de acompanhamento depois da autorização das vacinas Pfizer e Moderna, juntando crianças e adultos, o risco de miocardite foi de 5 casos em cada milhão de pessoas vacinadas. Esse risco é insignificante comparado aos problemas cardíacos provocados pela covid e, no caso das crianças, aos da síndrome inflamatória multissistêmica, complicação grave que se instala em diversos órgãos (entre os quais o coração), e pode levar às unidades de terapia intensiva e ao óbito.
Além disso, como a dose aplicada em crianças equivale a 1/3 daquela administrada aos adultos, a possibilidade de miocardite se torna mais improvável. Estudos conduzidos em Israel e nos Estados Unidos mostraram que a incidência de miocardite pós-vacinal, na faixa etária de 12 a 15 anos, é mais baixa do que na população de 16 a 25 anos de idade. Por analogia, nas crianças com 11 anos ou menos, devemos esperar riscos mais baixos ainda.
Todos os que tivemos ou têm filhos pequenos vivemos a experiência de vê-los com resfriados de repetição, contraídos a partir do momento em que são mandados para a escola. Crianças brincam juntas, correm e se aglomeram na hora do recreio, impossível mantê-las distantes umas das outras. Depois, trazem para casa os vírus que circulam no ambiente escolar, agem como vetores de transmissão para os mais velhos que, no caso da covid, podem adquirir uma forma grave.
Esses dados mostram que o Brasil precisa vacinar todas as crianças com mais de 2 anos (futuros estudos talvez demonstrem que pode ser antes). As perdas cognitivas por mantê-las em casa por quase dois anos são incalculáveis, especialmente no caso das mais pobres. Cada vez que uma delas adoece, as aulas são suspensas, prejudicando todas.