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Um estudo conduzido no Brasil constatou que a estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacral (ou eletroneuroestimulação parassacral) trata de maneira eficaz 70% dos casos de disfunção vesical e intestinal na infância. Estima-se que a disfunção vesical e intestinal na infância atinge 7,5% das crianças entre cinco e 14 anos. Essa é uma condição que consiste em incontinência urinária e constipação com quadros frequentes de infecção urinária.
“Muitos pais e médicos desconhecem a associação de quadros de incontinência urinária concomitante com a prisão de ventre. Cerca de metade das crianças com incontinência urinária também têm constipação. Essa é a principal causa de infecções urinárias recorrentes após o desfralde. Diagnosticar essa condição e tratar é importante para que no futuro esse paciente não venha a ter uma síndrome da dor pélvica crônica ou bexiga hiperativa”, explicou o orientador da pesquisa, o urologista Ubirajara Barroso Júnior.
Mais sobre o estudo
A estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacraal tem sido utilizada para controlar os sintomas do trato urinário inferior refratários à uroterapia padrão. No entanto, sua real eficácia no tratamento da disfunção vesical e intestinal ainda precisa ser estabelecida. Os pesquisadores avaliaram a eficácia da estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacral no tratamento de crianças com disfunção urinária e intestinal.
O ensaio clínico randomizado foi realizado com 40 crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos com diagnóstico de disfunção urinária e intestinal. Foram excluídos do estudo pacientes com alterações neurológicas ou anatômicas do trato urinário ou digestivo, impossibilitados de comparecer às sessões de tratamento três vezes por semana, portadores de diabetes mellitus ou diabetes insipidus e usuários de anticolinérgicos ou laxantes.
A amostra foi dividida em dois grupos: um grupo controle submetido à uroterapia padrão mais eletroterapia sham aplicada na região escapular e um grupo tratamento submetido à uroterapia mais estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacraal. Todos os pacientes foram submetidos a três sessões de eletroterapia (estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacraal ou sham) de 20 minutos por semana, totalizando 20 sessões.
Os sintomas do trato urinário inferior melhoraram em ambos os grupos após o tratamento, sem diferenças estatisticamente significativas na pontuação do sistema de pontuação disfuncional da micção, sintomas do trato urinário inferior ou padrões de urofluxometria entre os grupos.
A avaliação intragrupo mostrou uma melhora significativa na enurese no grupo de tratamento. Houve uma melhora significativa na constipação funcional pós-intervenção no grupo de tratamento em comparação com o grupo de controle (70% vs 20%, p = 0,004).
“Após o tratamento, 70% das crianças do grupo tratamento tiveram uma melhora significativa na constipação funcional, contra 20% do grupo controle. Os sintomas urinários melhoraram em ambos os grupos após o tratamento, sem diferenças estatisticamente significativas no sistema de pontuação disfuncional da micção”, informou Barroso Júnior.
O estudo inédito comprovou que estimulação elétrica nervosa transcutânea parassacraal é eficaz para o tratamento de disfunções vesicais e intestinais em crianças e adolescentes, principalmente no que diz respeito à constipação funcional.
Protocolo brasileiro
A eletroneuroestimulação parassacraal começou a ser usada pela equipe do urologista em 2001 no tratamento da incontinência urinária infantil. Apesar de já ser utilizada em alguns centros do mundo, era realizada com sessões diárias, por horas e diversos meses.
Um novo protocolo, mais curto e com sessões menos demoradas, foi desenvolvido na Escola Bahiana de Medicina. Atualmente, os principais estudos sobre eletroneuroestimulação parassacraval seguem os protocolos estabelecidos pelos estudos publicados pela equipe de Barroso Júnior.
“Verificamos que quem também tinha prisão de ventre estava se beneficiando do tratamento e decidimos estudar a fundo. Assim, conseguimos comprovar que essa técnica também trata a constipação. Esse é o primeiro tratamento que trata as duas condições juntas, pois a terapêutica para disfunção vesical intestinal atualmente engloba duas modalidades de tratamento, uma para cada um dos problemas”, explicou o urologista.
De acordo com o especialista, o mecanismo total da ação ainda está sendo estudado. “Pressupomos que a condução elétrica viaja pela medula e chega ao córtex frontal cerebral, região que controla a bexiga e o intestino, estimulando os órgãos”, afirmou.
O tratamento convencional para disfunção vesical intestinal na infância é com medicação anticolinérgica para a bexiga e laxante para o tratamento da constipação. O problema é que a medicação provoca constipação, além de efeitos colaterais, como boca seca e intolerância ao calor.
Orientações aos médicos
A incontinência urinária é caracterizada quando a criança a partir dos cinco anos tem pelo menos um escape de urina por semana, seja diurno ou noturno. Já a constipação intestinal é definida se a criança tem pelo menos dois itens positivos dos critérios de Roma IV.
“Esses critérios incluem seis itens: defecar menos que três vezes por semana, dor e esforço para defecar, episódio de incontinência fecal, postura retentiva, massa fecal no reto e fezes grandes”, ressaltou a coloproctologista Glícia Abreu.
Segundo a especialista, a criança começa a ter controle da defecação em torno dos três anos. “O tratamento da constipação pode ser complexo. Cerca de 40% das crianças constipadas recidivam após um ano de tratamento para a constipação. Também já se observou que 25% das crianças constipadas se tornam adultos constipados e muitas vezes de difícil tratamento. Além disso, os responsáveis muitas vezes suspendem o uso necessário de laxantes por receio de o “intestino se acostumar””, alertou a especialista.