Hoje o Brasil conta com o Sistema Único de Saúde, conhecido como (SUS), instituído na constituição de 1988 e com cobertura universal. Já no que se refere a seguros de saúde privados, atualmente cerca de 25% da população brasileira conta com este serviço. Se considerarmos o contexto atual de envelhecimento populacional, adicionar isso à prevalência de doenças crônicas e altos custos em procedimentos aos cuidados em saúde, temos aí a receita para um grande aumento de reclamações de beneficiários idosos, comparando a adultos e crianças.
No Brasil, a despeito da garantia constitucional de um sistema universal público de saúde para sua população, as políticas governamentais de saúde foram responsáveis pelo estabelecimento, consolidação e crescimento do setor privado de saúde. Se por um lado garantiu o direito constitucional de saúde universal e igualitária aos cidadãos, também contribuiu para a consolidação de um setor privado de saúde política e economicamente relevante. A estruturação do setor de saúde suplementar é consequência das relações historicamente estabelecidas entre o Estado e o setor privado de saúde. Embora, ao longo do tempo, o setor saúde no Brasil tenha adquirido composições variadas do papel público e privado em função da política de saúde, sempre houve intersecção entre Estado e serviços privados, que foram se consolidando com forte financiamento público.
Nesse quadro agrega-se principalmente a questão do envelhecimento populacional, algo já visto em grande parte do mundo desenvolvido. O envelhecimento da população foi um processo gradual acompanhado de crescimento socioeconômico constante durante muitas décadas e gerações, enquanto no Brasil, vem ocorrendo de forma bastante acelerada.
Diante deste contexto de transição, resultando no aumento da população de idosos, discute-se o impacto do envelhecimento sobre o aumento dos custos dos serviços de saúde, sem falar nas questões previdenciárias. Com 25% da população vinculada à planos privados de saúde, aproximadamente 11% dos beneficiários destes têm 60 anos ou mais, fazendo parte de um grupo populacional mais propenso para doenças crônicas por fatores naturais e, por conta disso, com uma maior probabilidade de utilização dos serviços de saúde, consequentemente gerando custos mais altos.
A expansão do setor privado no Brasil transformou a assistência à saúde em um bem de consumo, mas também em uma ferramenta de seleção de risco. Nessa seleção pode-se afirmar que o idoso é infelizmente um cliente indesejado para as operadoras de planos de saúde, pois apresenta uma maior possibilidade de tratamentos muito mais caros nos anos finais de vida.
Nesse ponto de vista há de se reconhecer um ponto de tensão considerável na relação entre a população idosa e as operadora de saúde, pelas dificuldades em adquirir um planos de saúde, em virtude dos altos custos e dificuldades impostas por conta da faixa etária, como exigir relatórios médicos e entrevistas qualificadas em alguns casos. Embora estas condutas incidam sobre todos os grupos, pode-se supor que seu efeito seja maior nas faixas etárias mais avançadas ou em portadores de doenças cujo tratamento inclui uso intenso de tecnologias de alto custo, gerando um impacto do reajuste da mensalidade ao atingir a última faixa etária que é de 59 anos em diante, resultando na migração do idoso para o SUS.
Além da seleção de clientela e de riscos, as operadoras também utilizam mecanismos previstos na regulamentação da saúde suplementar, para controle tanto da demanda quanto da utilização dos serviços e isso pode ser visto em aplicações de carências de 24 meses. Essa “restrição” de acesso gera muita insatisfação entre os beneficiários, especialmente quando obtêm uma indicação médica para realização de determinado procedimento e deparam-se com várias negativas de procedimentos, postergações ou omissões por parte da operadora de saúde.
Podemos também citar que um dos principais motivos para insatisfação com os planos de saúde seja por conta da demora na marcação de consultas, sejam ela eletivas ou até mesmo para tratamentos, atendimentos e exames. Independentemente da reclamação se configurar ou não em uma infração à legislação de saúde suplementar, ela gera um impasse entre operadoras de saúde e beneficiários. O reconhecimento desse fator de tensão é importante para enxergar – e buscar soluções, para problemas que tendem a se agravar com o aumento da população de idosos no Brasil.
A discussão deve ser estendida a todos, pois expõe uma distorção da sociedade, entre os menos e os mais beneficiados, aqueles que podem pagar por um plano de saúde mais caro, com rede credenciada e hospitais de nível superior, e aqueles que ingressam no sistema de saúde suplementar por meio de vínculo empregatício, sentem-se “seguros” e acabam por ignorar o sistema público de saúde.
No entanto, ressalto, os beneficiários que hoje são considerados de menor risco assistencial, serão os idosos e aposentados do futuro, mais suscetíveis à micro regulação exercida pelos planos de saúde.